Duas cartas sobre a paz.

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Não bastaram as duas conflagrações mundiais do século 20 e as guerras e invasões localizadas ao redor do mundo para que servissem de exemplos à Humanidade sobre os prejuízos que a beligerância desenfreada traz para todos. Passou-se para um novo milênio, todavia a destruição orquestrada por alguns Estados contra outros ou de grupamentos sociais inconformados com a convivência pacífica continua e pelas razões mais estapafúrdias para justificar o ataque ou a invasão territorial do solo alheio.

Parece até que a todo o momento se renovam as tentativas de levar o mundo a uma conflagração, dando um fim à própria Humanidade. Nestas ocasiões, é salutar e propício que se levantem, em todos os quadrantes do planeta, as vozes daqueles que ainda pensam ser possível dar mais uma chance para que os homens possam continuar sobrevivendo em paz e harmonia.

Nunca será fastidioso repetir incansavelmente que o nosso planeta é a casa destinada a nos abrigar e sempre foi em seu solo que milhares de gerações tiraram e continuarão a tirar todos os meios para a sua sobrevivência. Falar de paz, portanto, deveria ser uma prática constante e perene e sem as limitações, pois criar condições para que vivamos em paz, é dar sequência à obra criadora de Deus.

Com certeza, alguém pode imaginar que estaria contribuindo para a demasiada perda de tempo, ao falar sobre a paz. Nem penso em dizer algo inédito ou ainda não escrito. Contentar-me-ia a repetir aquilo que exaustivamente já teriam dito.

Por esta razão, me animo a transcrever duas páginas marcantes escritas em 1932 sobre a paz, representadas pela troca de correspondência entre dois gênios da Humanidade – Albert Einstein (1879-1955) físico alemão, Prêmio Nobel de Física em 1921 e Sigmund Freud (1856-1939), médico austríaco fundador da Psicanálise. Aqui estão.

“Caro Professor Freud. A proposta da Liga das Nações de que eu convidasse uma personalidade, à minha escolha, para um franco intercâmbio de opiniões acerca de qualquer problema que eu queira abordar, oferece-me a grata oportunidade de discutir com o senhor uma questão que, no presente momento, parece ser o mais persistente de todos os problemas que a civilização tem de enfrentar. Haverá algum meio de libertar a Humanidade da ameaça da guerra? É de conhecimento público que, com o avanço da ciência moderna, essa indagação passou a significar uma questão de vida ou de morte para a civilização, tal como conhecemos. (…) Potsdam, 30 de junho de 1932. A. Einstein.”

A resposta de Freud não tardou, nos seguintes termos.

“Caro Professor Einstein, (…) O desenvolvimento cultural da Humanidade (há quem prefira chamar de civilização) está em marcha desde tempos imemoriais. A este processo devemos tudo que há de melhor em nossa formação mas igualmente muito do que contribui para o sofrimento humano. Suas origens e causas são obscuras, seu resultado incerto, embora algumas de suas características sejam facilmente identificáveis.

Esse processo poderá ainda culminar na extinção da Humanidade, já que ele prejudica a função sexual em mais de um aspecto…. A guerra dirige-se mais enfaticamente contra a disposição psíquica que nos é imposta pelo desenvolvimento da cultura; por isso temos de nos ressentir contra a guerra e achá-la em última instância intolerável. Para pacifistas como nós a repulsa não é apenas intelectual e afetiva, mas uma intolerância constitucional, uma idiossincrasia em sua forma mais aguda. Parece que a estética ignominiosa da arte da guerra desempenha importante papel na repugnância às atrocidades da guerra.

“Por quanto tempo teremos de esperar para que o restante dos homens se torne pacifistas? Impossível dizer. Talvez nossa esperança de que estes dois fatores – a disposição cultural do homem e um bem fundamentado terror das formas que as guerras vindouras assumirão – possam ajudar a pôr um fim à guerra num futuro próximo não seja algo quimérico. Mas por que meios ou desígnios isto acontecerá, não podemos saber. Enquanto isso, podemos esperar na certeza de que tudo que contribui para o desenvolvimento cultural também está trabalhando contra a guerra. Seu, Sigmund Freud. Viena, setembro de 1932”.

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